A FNE enviou a 13 de junho, ao Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, um ofício em que defende a necessidade de compromisso e de ação no Ensino Português no Estrangeiro (EPE).
Para a FNE, o EPE não pode nem deve estar unicamente direcionado para o ensino do português como língua estrangeira, nem sujeito a uma gestão meramente tecnocrática, marcada por uma lógica excessivamente economicista.
Este compromisso e ação devem incidir no fim da discriminação do ensino paralelo, num ensino gratuito e de qualidade, na valorização dos professores, numa avaliação justa e na urgente revisão do Regime Jurídico do EPE.
No ofício, a FNE recorda que o sistema de EPE foi criado para transmitir aos filhos dos trabalhadores portugueses emigrados os conhecimentos de língua e cultura portuguesas necessários à preservação da ligação afetiva, linguística e cultural a Portugal.
Contudo, desde que passou para a tutela do Camões, Instituto da Cooperação e da Língua, aqueles cursos foram progressivamente transformados em cursos de Português como Língua Estrangeira, em conformidade com a orientação daquele instituto, cujos responsáveis defenderam repetidamente que, para que a língua portuguesa fosse reconhecida no estrangeiro, teria de ser ensinada como língua estrangeira.
Para a FNE, esta mudança de paradigma promoveu uma ideologia segundo a qual professores, pais e alunos foram levados a acreditar nas vantagens de um certificado de proficiência linguística que, na prática, apenas atesta as competências dos alunos portugueses e lusodescendentes na vertente de Português como Língua Estrangeira.
No entanto, esse certificado não é reconhecido por nenhum sistema de ensino europeu, nem é útil para a eventual continuidade de estudos em estabelecimentos de ensino básico, secundário ou superior em Portugal.
Com a introdução, em 2013, da taxa/propina de frequência no EPE – apresentada como uma vantagem, dado que as provas de certificação passariam a ser gratuitas – perderam-se cerca de 18 mil alunos devido ao encerramento de cursos, uma vez que muitos encarregados de educação recusaram efetuar o pagamento exigido.
A propina de frequência foi aplicada única e injustamente aos alunos portugueses e lusodescendentes, especialmente na Alemanha, Suíça e Reino Unido, onde as aulas de português decorrem fora do horário escolar regular, no chamado ensino paralelo.
Já em França, Espanha, Bélgica, África do Sul, Luxemburgo, Namíbia e Essuatíni, onde geralmente as aulas ocorrem dentro do horário escolar e com uma elevada percentagem de alunos sem nacionalidade portuguesa, foi permitida a isenção de pagamento.
Os alunos destes países continuam, até hoje, a beneficiar de um ensino gratuito e de qualidade superior àquele ministrado no ensino paralelo, onde existem turmas com alunos de três ou mais níveis de escolaridade.
A FNE sublinha que, tal como os cidadãos em território nacional, também os portugueses residentes no estrangeiro estão cansados de promessas não cumpridas e da qualidade insatisfatória dos serviços públicos.
O ensino da língua e cultura portuguesas, que sempre teve importância primordial para os portugueses emigrados, tem sido alvo de desinvestimento e desvalorização, contando atualmente com menos de metade da dimensão que tinha em 2010.
O presente ano letivo de 2024/2025 termina com um total de 317 professores a nível mundial e cerca de 38 500 alunos, muitos dos quais não são de origem portuguesa. Muitas crianças e jovens portugueses e lusodescendentes que, pelas razões já referidas, deixaram de frequentar as aulas da sua língua e cultura de origem, às quais têm direito constitucional, afastar-se-ão progressivamente da nossa língua e cultura. Para a FNE, está em causa a nossa portugalidade e a nossa presença no estrangeiro.
Neste novo ciclo político, compete ao Governo garantir aos filhos dos trabalhadores portugueses emigrados um ensino gratuito, presencial e de qualidade da sua língua e cultura de origem, adotando medidas que visem corrigir erros do passado e instituir melhores condições no presente e para o futuro. É hora de virar a página no EPE.
Deste modo, a FNE defende que deve ser dada prioridade à valorização dos professores de português no estrangeiro, pois são eles que mantêm viva a nossa língua e cultura além-fronteiras. Tal não poderá ser concretizado com salários estagnados desde 2009 e com condições de trabalho que roçam o inaceitável, como deslocações diárias superiores a 300 quilómetros e a necessidade de lecionar, semanalmente, alunos do primeiro ao décimo segundo ano, sem qualquer redução de horário ou compensação.
Para a FNE, não se atraem professores para o EPE recusando-lhes o pagamento dos subsídios de instalação e de regresso – previstos na lei, mas atribuídos apenas a leitores e coordenadores de ensino – e, ao mesmo tempo, exigindo-lhes intermináveis tarefas burocráticas que lhes retiram o tempo necessário à preparação das aulas.
A estes fatores acresce uma avaliação de desempenho injusta e fortemente discriminatória, que carece de urgente revisão. É igualmente imprescindível promover uma reflexão crítica sobre as condições em que tal revisão é realizada.
Urge também rever o Regime Jurídico do EPE, constante do Decreto-Lei n.º 65-A/2016, de 25 de outubro, extremamente desatualizado e com disposições que remontam a 1998, altura em que vigorava o regime de destacamento, e que já não são aplicáveis à situação atual.
No parecer da FNE é indispensável promover um debate alargado que vise melhorar, renovar e dignificar o ensino português no estrangeiro, seja na vertente de língua de origem e identitária, seja como língua estrangeira.
A FNE e o seu Sindicato dos Professores das Comunidades Lusíadas (SPCL)PCL desejam, por esta via, reafirmar a sua total disponibilidade para iniciar processos negociais efetivos e produtivos – que não têm lugar desde 2019 – que respeitem o trabalho dos professores e respondam às suas legítimas reivindicações.
Para a FNE, não é possível – a menos que a intenção seja extinguir o EPE ou reduzi-lo à sua expressão mínima – manter os atuais procedimentos e continuar a adiar decisões. Se existe um verdadeiro desejo de garantir um futuro digno para o EPE, é necessário assumir um compromisso político firme para que esse objetivo seja concretizado.
Uma educação de qualidade é tão importante para as crianças e jovens que vivem em Portugal como para aqueles que residem no estrangeiro, mas que desejam manter a sua ligação cultural, linguística e afetiva ao seu país, ao nosso país.